Vieram a público esta semana imagens captadas por uma micro-câmera escondida em um gabinete em Brasilia. Nas imagens pode-se ver alguns homens - entre eles o Governador Arruda - em transações espúrias, envolvendo grandes somas de dinheiro escondidas sob as vestes. Indagado por jornalistas, o Presidente Lula declarou que "as imagens não falam por si", e vem sendo duramente criticado por esta afirmação.
Contudo, que uma imagem não fala por si, isto me parece claro.
Uma imagem precisa de um contexto e de um discurso. Uma imagem, por si só, não fala nada. Acreditar que as imagens falam por si, significa atribuir às imagens um valor fora da linguagem, da cultura e da humanidade, tarefa impossível.
Foi infeliz o momento desta certeira declaração presidencial, no calor da hora de denúncias tão graves. No entanto, a precisa afirmação do Presidente é da mesma natureza do pensamento desenvolvido por Marie-José Mondzain, há cerca de dez dias em sua conferência na UFRJ.
A filósofa francesa traçou uma genealogia do pensamento sobre a imagem, da Grécia a contemporaneidade, nos encaminhando por um raciocínio aonde a imagem só pode ser pensada como um objeto de crise; a imagem não é nem ser e nem realidade.
A afirmação do nosso Presidente me lembra o caso citado por Andréa França em minha defesa de Mestrado. Nos EUA, um estudante negro foi barbaramente espancado por um grupo de estudantes brancos, e o episódio foi registrado por uma câmera de circuito interno. O caso foi a julgamento, e surpreendentemente as imagens captadas por esta camera foram utilizadas pelos advogados de defesa dos rapazes brancos! Eles ampliaram os videogramas para mostrar que o rapaz negro, mesmo deitado, estaria chutando contra o grupo, e que eles estariam apenas se defendendo. As imagens se prestaram a uma reinvenção dos fatos!
Perfeitamente, as imagens não falam por si. Elas servem a interesses políticos, financeiros, estratégicos, artísticos. Elas falam quando articuladas em um discurso, que baliza o que há para ser visto ali. Postular que as imagens falam por si é de uma ingenuidade não mais possível nos dias de hoje.
nota de esclarecimento: Abomino as redes de corrupção e enriquecimento ilícito tão observadas nas administrações públicas de nosso país. Indignação e vergonha são apenas alguns dos sentimentos de revolta que posso enumerar diante das denúncias dos esquemas de propina que mais uma vez tomam conta do nosso noticiário.
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